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sexta-feira, 30 de junho de 2017

BRAVA DANÇA

Brava Dança
Jorge Pires e Jorge Pinheiro, 2006
Estreia Nacional: 08-03-2007, ZON Lusomundo

A história do grupo Heróis do Mar foi revisitada no cinema em «Brava Dança», documentário de Jorge Pires e José Pinheiro que propõe ainda uma reflexão sobre Portugal e a música do pós-25 de Abril. O documentário recorda o trajecto da banda pop na década de 1980 e, através desse percurso, dá a conhecer uma época da música portuguesa ainda com a memória recente da Revolução de 1974. "Os Heróis do Mar têm uma história bastante definida temporalmente e em termos de vida cultural lisboeta têm bastante importância, são a expressão de uma modernidade urbana, cosmopolita", explicou Jorge Pires. José Pinheiro, autor de mais de uma centena de telediscos, referiu também que "os Heróis do Mar são um pretexto para falar da juventude pós-25 de Abril, sobre as suas expectativas e a relação com o país". Saídos dos Faíscas e do Corpo Diplomático, os Heróis do Mar surgiram em 1981 - completariam 25 anos em 2006 - , com Pedro Ayres Magalhães, Rui Pregal da Cunha, Carlos Maria Trindade, Pedro Paulo Gonçalves e António José de Almeida. Em Agosto de 1981 saiu o primeiro single com os temas «Saudade» e «Brava Dança dos Heróis» e três meses depois actuaram no Rock Rendez Vous, em Lisboa, apresentando uma estética inspirada no imaginário histórico português. Era também o começo do «rock português», dos GNR, de Rui Veloso ou dos UHF, numa «linhagem bastante lógica», desde «as primeiras tentativas de música eléctrica», como recorda José Pinheiro. Apesar da diversidade, Jorge Pires encontra na música dos anos 80 «um espírito de mensagem que hoje em dia ninguém tem. Hoje não é preciso dizer nada para se fazer um disco, mas naquela altura era fundamental». No caso dos Heróis do Mar, a mensagem das suas canções e até a forma como se apresentavam, com a utilização da bandeira nacional e da Cruz de Cristo, chegou a ser conotada com ideais fascistas. Os autores do documentário atribuiram essa polémica à imprensa da época, «espartilhada por divisões ideológicas profundas». «Foi o choque de reacção arcaica perante qualquer coisa nova que aparece com outra linguagem», opina Jorge Pires, referindo que «houve um conflito entre graus diferentes de percepção da realidade». «Os Heróis do Mar foram uma banda verdadeiramente moderna no seu tempo sem deixarem de ser portugueses. Na altura, se calhar, ser português e moderno fez confusão a muita gente», corrobora José Pinheiro. «Brava Dança» reune entrevistas feitas aos cinco elementos dos Heróis do Mar e a dezenas de outras pessoas, entre estilistas, fotógrafos e músicos, que deixam um testemunho sobre a época. Com este documentário, Jorge Pires e José Pinheiro acreditaram que estariam a «criar memória audiovisual», porque o filme condensa material raro, inédito e de arquivo que esteve disperso durante anos. «Temos um défice de memória e de registos e fazer um documentário sobre isto é fazer uma história que nunca ninguém se deu a trabalho de fazer», criticou o jornalista. Entre o material contam-se entrevistas, telediscos, fotografias, cartazes, recortes de imprensa, programas televisivos, imagens de arquivos particulares e estrangeiros. Além do material recolhido da RTP, conseguiram obter também dos arquivos nacionais franceses «as únicas imagens que há do Heróis do Mar a tocar ao vivo, com o som e a imagem que tinham quando apareceram». Na pesquisa para o documentário, Jorge Pires e José Pinheiro encontraram ainda «gravações raríssimas» dos Faíscas e inéditos dos Heróis do Mar que ficaram por editar depois do último álbum «Heróis do Mar IV», de 1988. Nessa altura, já Pedro Ayres Magalhães iniciava os Madredeus e António José de Almeida tinha saído do grupo, mas nunca houve uma comunicação oficial a ditar o fim dos Heróis do Mar. «Até 1991, 1992, os Heróis do Mar eram uma coisa adormecida como muitos outros grupos na altura estavam, por isso não era uma coisa assim tão estranha», afirma José Pinheiro. O orçamento para o filme, que contou com os 50 mil euros de subsídio atribuídos pelo Instituto do Cinema, Audiovisual e Multimédia, foi gasto quase todo na aquisição das imagens. [Diário Digital, Lusa 30-04-2005]